239

Kitana:

... mas algo lhe chama a atenção e a acorda. O teto iluminado por tochas, os passos das sacerdotisas correndo apressadas para lá e para cá...

Espere, teto?

O templo está intacto, perfeito; vozes abundam lá fora numa confusão de línguas e sons, e o cheiro de ervas e oferendas enche o ar. Uma mulher nota Kitana e vai até ela. "Esta área não é para fiéis, é para o sacerdócio. Perdeu-se?" pergunta, gentil.

A surpresa era evidente no rosto quase inexpressivo de Kitaan, devia estar sonhando. Sonhando com o auge dos dias de glória de Delfos, quando todos respeitavam a palavra do Oráculo. Uma sacerdotisa se dirige a ela, a mestiça tentava se lembrar do rosto da mulher a sua frente, mas não conseguia associá-lo a nenhuma das sacerdotisas em exercício.

"Onde está Atanásia-san?", perguntou já levemente recuperada do choque. "A senhorita é nova no sacerdócio d'O Luminoso?"

Talvez aquela sacerdotisa houvesse chegado há pouco tempo, talvez ainda não tivesse conhecido-a e não sabia quem era Kitana Mas quando os devotos haviam acabado de reconstruir o Templo? Talvez estivesse tão ocupada em seus afazeres que nem houvesse notado a finalização, porém, como não notar algo tão grandioso? Talvez realmente estivesse sonhando.

Kitana:

"Não, deve estar confusa." ela ergue uma sobrancelha. "Sou uma sacerdotisa aqui há anos; meu nome é Hagne. O seu?..."

Aliás, pelo modo que está encarando, ela deve ter achado bem estranhas as feições de Kitana também. Afinal, todas as outras pareciam bem tipicamente gregas.

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Lucas:

... mas parece ter sido só um cochilo de alguns segundos. O céu está inalterado, as estrelas idem. Nada mudou...

... será?

Vozes conversam ali perto, e Lucas não as reconhece. Ele conhece a maior parte dos santos e dos civis que vivem mais perto do Santuário, e mesmo assim essas lhe são estranhas.

"Pela Deusa... não acredito nisso."

"Nenhum se salvou?"

"Acho que alguns sim, mas a maioria..."

Kitana já estava recuperada do choque inicial, mas a surpresa ainda permanecia.

"Hagne... Hagne...?", buscava em sua memória alguém conhecido com esse nome e não encontrava ninguém que se assemelhasse com a sacerdotisa prostrada a sua frente.

"Mas sou a Pitonisa, como posso não me lembrar de uma companheira de sacerdócio?", se perguntou novamente.

"Sou Kitana de Tirésias, a Donzela de Apolo...", preferiu deixar seu cargo de fora, por hora.

Olhou em volta e tentou imaginar aquele local sem o teto, em ruínas, para conseguir se localizar melhor, conhecia muito bem as ruínas de Delfos, mas aquela visão de uma cidade intacta, lhe era estranha.

Kitana:

"Tirésias?... mas... o anjo de Tirésias está morto, e não são muitos os fiéis que sabem a respeito dos guerreiros sagrados. Você é sua sucessora? Mas uma mulher?..."

Uma outra mulher, envergando uma túnica branca e simples, vem ao encontro de Hagne; seu penteado, segundo a tradição antiga, indica uma sacerdotisa de nível menor. "Senhora, as oferendas estão..." mas a mulher a faz calar com um gesto, intrigada com Kitana. "Estranhos são os augúrios que a envolvem, Kitana... Kitana de Tirésias. Terminarei meus deveres primeiro; poderemos conversar depois... se puder."

A jovem mestiça ainda se sentia meio confusa, por isso demorou a se dar conta de que ainda estava deitada, sentou-se fazendo uma rápida massagem nas têmporas antes de se levantar por completo. Era melhor ão responder ainda a pergunta da sacerdotisa, ainda mais com a chegada de uma outra de nível menor.

"Claro que posso, Hagne-san." ponderou brevemente, era tratada como uma estranha ali, então era melhor não atrapalhar os afazeres. "Onde posso aguardar sem causar transtornos?"

Fez uma breve mesura, em sinal de respeito e aguardou uma resposta da sacerdotisa.

Kitana:

"Poderá esperar aqui mesmo, se desejar... ou nos aposentos das sacerdotisas, que estão vazios por enquanto." ela aponta, indicando a direção. "Terminarei meus afazeres o mais rapidamente possível, e então poderemos conversar. Agora, com sua licença." faz uma mesura para Kitana e se retira, apressada, seguindo a outra sacerdotisa.

Mais tarde, tendo o movimento no templo praticamente cessado, ela vem ter com o anjo; as mulheres servem vinho, água, frutas, pão. Reclinada num divã - há outro para Kitana -, ela parte um pedaço de pão com os dedos, pensativa. "Anjo de Tirésias. Lembro-me ainda de Nikias, nosso tão amado; de como chegou aqui, mortalmente ferido, após rechaçar o ataque dos Gigas que se aproximavam de Delfos. O quanto choramos por ele!..." ela suspira, pausa. A memória realmente parece dolorida. "Com que então, é a escolhida de Tirésias... isso é deveras incomum. Tão pouco tempo se passou; e uma mulher guerreando é uma idéia estranha! Sempre pensei que fosse comum apenas às amazonas de Atena."

"Pois bem, aguardo aqui.", fala enquanto vê Hagne se retirar.

Mais tarde, foi levada a um locla onde Hagne já a aguardava. Ela era servida por outras sacerdotisas, essas lhe traziam toda sorte de pães, frutas, definitivamente devia ser uma época de riqueza e fartura para Delfos. A sacerdtisa oriental se senta no outro divã, mantendo a postura rígida, queria descobrir o que estava acontecendo e não era hora para relaxar.

"Nikias...", pensou ao ouvir o nome, conhecia um pouco da história de seus antecessores e Nikias estava entre eles.

"Gigas, você diz?", pergunta retóricamente, tentando assimilar aquela informação melhor, certamente não estava em sua época, mesmo que tudo aquilo fosse um sonho, seria melhor saber tudo que podia saber. "Me permite saber o ano em que estamos?"

Ela podia ver o sofrimento, o guardião deveria ser muito querido. Mas aguardou uma resposta antes de explicar aquela situação maluca em que se encontrava, não diria nada, antes de ter certeza de que tudo aquilo era real. Tão real quanto parecia ser.

Kitana:

"Terceiro ano da 253ª Olimpíada." responde Hagnes, orgulhosa. "No calendário gregoriano, acredito que seja..." e pensa um pouco, fazendo as contas. Uma sacerdotisa - esta morena, de compleição muito diferente, talvez uma estrangeira - ajuda, solícita: "Ano 239 Anno Domini, como dizem os imigrantes."

"Exatamente. Por que a pergunta?"

Não, mesmo que Kitana posuísse um auto-controle quase sobre-humano, o que possuía, essa informação era espantosa demais para ser realidade. Seu rosto empalideceu de forma suave e seus olhos se arregalaram, o silêncio durou por alguns minutos, até que ela conseguisse digerir parcialmente aquela informação.

"239... Surpreentende... É, mas faz sentido se estão guerreando contra os Gigas...", comentou consigo mesma, ainda incrédula.

Mais um momento pensativa, tentava achar a melhor forma de explicar aquilo para as sacerdotisas sem parecer uma lunática.

"Hagne-san... Pode pareecer loucura, mas estou sendo completamente sincera.", iniciou com um tom calmo e cauteloso, aquilo seria um choque para ela. "Sou Kitana, anjo de Tirésias... Nikias, que morreu devido aos ferimentos na batalha contra os Gigas foi apenas um, dentre os muitos de meus antecessores a Anjo de Tirésias... Eu só fui escolhida como portadora da Alva e eleita para o cargo de Pitonisa de Delfos no ano de 2045. Quando a Delfos que vêem hoje estava em ruínas e quase completamente destruída. Quando o mundo perdeu a fé n'O Luminoso e são poucos aqueles que acreditam nas palavras da Pitonisa."

Pronto, estava feito, Parecia absurdo... Mas era a verdade, sabia que aquela informação não seria bem recebida, aquilo tudo parecia.uma loucura e era! Agora, só restava esperar para ver como reagiriam as sacerdotisas.