Insônia

Um vento frio uiva e esvoaça o cabelo de Kathleen. O lugar começa a ficar abafado, e, lentamente, como uma bola de neve, uma sensação mista de agonia e emergência - como se uma catástrofe estivesse para acontecer - toma conta de todo o recinto. Algo estava acontecendo ali.

Quando percebeu, uma coisa, éterea como um fantasma, atravessou Kathleen pelas costas. Nesse instante, as noções de tempo e espaço da Dama Infernal ficaram alteradas, e ela sentiu como se algo a tivesse levado para algum lugar muito longe do castelo onde estava, num flash, como se tivesse voado a milhares de quilômetros por hora. Quando viu, estava em um campo desolado, tomado pelo frio e pelo nada... A única coisa, além dessas duas, a vigorar no local é a estranha sensação de agonia e emergência. Diante de tal sensação, todas as coisas - mesmo as eternas - parecem efêmeras e prestes a sumir...

Algo se manifesta logo atrás de Kathleen. Antes que ela pudesse se virar, uma mão esquelética repousou em seu ombro, paralisando seus movimentos. O máximo que ela podia ver era a mão esquelética e algo que lembra uma manta pesada encobrindo o resto do braço. Ela não podia virar para trás, e tinha a impressão que perderia a vida se o fizesse.

Pandora sente um ar frio no pescoço, como se alguém se aproximasse dela para sussurar palavras. Ela ouve uma voz, que se assemelha ao último suspiro daqueles que estão para morrer, cheia de mistérios. Apesar de assustadora e horripilante, a presença tentava ser gentil com Kathleen.

"Pandora... Em tempos imemoriais, foi prometido o descanso eterno aos merecedores. Esta promessa deve ser cumprida..."

"Procure Sísifo... E faça com que as promessas antigas sejam cumpridas. Do contrário... Haverão consequências"

A presença bizarra desaparece e o local começa a ficar abafado, até Kathleen sufocar. Ela finalmente desperta em seu quarto, deitada, sozinha, com as extremidades do corpo geladas.

O grande livro dos mortos - um enorme e emoldurado livro, que, quando fechado, fica trancado a cadeado - menciona o nome Sísifo centenas de milhares de vezes. Mas, como num passe de mágica, o livro concentra-se em apenas menções.

A primeira menção - uma menção antiguíssima, provavelmente referente à primeira geração de mortos - refere-se a um antigo rei grego chamado Sísifo, condenado à ficar preso no Hades pela eternidade por ter trapaceado a Morte. O livro descreve o rei como o mais ardiloso dos homens, como um rei que matava seus adversários para manter seu poder - e sentia prazer em fazê-lo. Por ter enfurecido os deuses - Hades em especial -, Sísifo fora condenado a erguer pedregulhos ladeira acima, eternamente, sem descanso, na terceira prisão.

A segunda menção do nome Sísifo é muito mais recente que a primeira. Segundo o livro, Sísifo também é o nome de um antigo cavaleiro de Atena, o líder dos cavaleiros de seu tempo e um nobre homem. Por ter vivido de modo nobre e limpo, Sísifo ganhara dos deuses estadia nos Elísios. Todavia, o cavaleiro desejou repousar em um local onde pudesse trabalhar, para alimentar as lembranças de seu tempo como cavaleiro. Deste modo, este Sísifo fora enviado à terceira prisão.

Ao ler as entradas, Kathleen tem a certeza de estar tratando com almas indubitavelmente antigas e poderosas. A momentânea ausência de espectros cria dificuldades para a Dama Infernal. Talvez fosse o caso invocar algum espectro antiguíssimo... Ou talvez fosse o caso aguardar a chegada de novos espectros...